Responsabilidade Social da Empresa em tempos de Mudanças Climáticas

Acrescentemos ao título, “em tempos de mudanças climáticas de origem antrópica, de origem humana”. Porquanto, mudanças climáticas é um fenómeno que acompanha a evolução humana, porém, nos últimos tempos temos verificado alguma acentuação nas causas, intensidade e consequências das mudanças climáticas. E para melhor percebermos o porquê desse incremento, talvez as quatro revoluções industriais oferecem elementos de elucidação (Nacir, 2018).

Primeiro, temos a revolução industrial inglesa (séculos XVI e XVII), isto é, 1765 e a criação da máquina à vapor, máquina de tecer e o uso do comboio como dos principais meios de transporte de mercadorias.  Segundo, a revolução de 1870 – descoberta da eletricidade, descoberta e uso do gás natural (e a produção de fertilizantes para o uso agrícola) e a descoberta do petróleo. Terceiro, a revolução nuclear e tecnológica de 1969, porquanto houve nesse período a descoberta da energia nuclear e os avanços tecnológicos. Quarto, por fim, a revolução numérica, robótica e da Inteligência Artificial (IA); a revolução do século XXI que é relacionada à revolução tecnológica. Aliás, todas essas revoluções estão interligadas.

A importância dessa breve demonstração serve para acomodar a ideia de que essas revoluções estão estritamente ligadas não apenas entre elas, mas também à exploração do meio ambiente. O comboio precisava de carvão, e carvão cria deflorestação. O gás natural e o petróleo são dos combustíveis fosseis que mais contribuem para as mudanças climáticas, por via do aquecimento global. A energia nuclear é demasiado ariscada para o meio ambiente – basta lembrar Chernobyl, Ucrânia, meados da década 80. Porém, a mais recente das revoluções, procura reconciliar-se com o meio ambiente, pretendendo usar de forma limitada os recursos naturais, visto que ela se insere no contexto do aumento das preocupações de proteção e preservação ambientais.

Paralelamente, podemos relacionar com as revoluções industriais o significado moderno de empresa. Isso porque, vão surgir projectos de exploração da natureza, do meio ambiente in extenso, para fazer lucro. E esses projectos estarão inseridos dentro da sociedade, dentro das comunidades.

Este texto se inclui nessa relação entre exploração do meio ambiente para fazer lucro e a as consequências dessa exploração. É evidente que tomamos a revolução industrial inglesa como marco temporal, mas também contextual da nossa abordagem. Antes de avançar, importa lembrar que é um princípio lógico humano de que: as consequências trazem responsabilização. Esta feita nessora a ligação entre empresas, mudanças climáticas, e responsabilização.

Neste momento, pode-se pensar que quando arrolamos a Responsabilidade Social da Empresa (RSE) às mudanças climáticas, estamos a referir-nos apenas à empresas poluidoras ou directamene exploradoras de recurso naturais e do ambiente. Não. Não, pois todas empresas participam da exploração do meio ambiente, directa ou indirectamente. Então, aqui, nos referimos as diversas empresas, para não escrever todas.

Tomemos uma empresa simples de catering por exemplo. Esta pode argumentar que não participa na exploração dos recursos naturais. Mas basta uma breve analise para percebermos que ela propicia o consumo de carne bovina ou caprina, tal carne que é produzida em campos distantes da cidade, aonde se precisa de transporte para ir e voltar dos respectivos campos, e quem fala de transporte fala de uso de combustíveis, muitas vezes fosseis. Ela é parte do que os economistas ambientais reclamariam de cadeia de valor de exploração do meio ambiente. Por outro lado, a queima de combustíveis fosseis é das principais causas do aquecimento global, uma das componentes fulcrais das mudanças climáticas (Matthew Taylor, 2018). Veja-se o ciclo. 

Ademais a produção de bovinos, a agropecuária é também uma das principais causas do aquecimento global. E podemos estirar o exercício para todas as áreas, iremos encontrar traços que nos ligam ao ambiente, mediata ou imediatamente. Notemos que a simples construção de uma habitação, impacta o ambiente, por meio dos ecossistemas existentes anteriormente naquele lugar, ou da poluição causada pelos detritos da construção – remeto o leitor para o anterior texto sobre a diferença entre impacto ambiental e “impacto ecológico”.

Posto isso, recentremos a analise. Subho Mukherjee (Mukherjee, 2020) considera que a RSE, na verdade ele usa a terminologia “negócio” para significar empresa, implica responsabilidade do negócio em proteger os interesses da sociedade. Acrescenta que o negócio não deve ser tomado apenas com o fim de fazer lucro, mas também de servir e proteger os outros membros da sociedade. Esta é uma abordagem introdutória para nós, pois não encontramos aí explicito a palavra “mudanças climáticas”.

Isso porque, mesmo que as mudanças climáticas, o aquecimento global, a perca de biodiversidade, entre outros, tenham verificado um incremento após a primeira revolução industrial, é apenas recentemente, aos fins do século passado, que ganham importância na agenda dos Estados.  Inicialmente, com a conferência sobre a terra, de Estocolmo, no início da década 70, depois com o relatório Brundtland – nosso futuro comum – nos finais da década 80, e finalmente com a conferência do Rio de Janeiro e o protocolo de Kyoto, no começo e no final da década 90, respectivamente.

Então, tradicionalmente a RSE significa a inclusão das preocupações sociais, da comunidade circunjacente na agenda da empresa. Isso se traduz, muitas vezes, pela construção de recintos desportivos, centros culturais, escolas, centros de saúde/hospitais, entre outros. Pois, a empresa percebe que tira vantagens da comunidade, e procura assim devolvê-las. E atualmente quais são as preocupações da sociedade?

Temos uma pista na definição actualizada de RSE. Youmatter (Youmatter, 2020), nos oferece uma definição de fácil compreensão: conjunto de práticas implementadas pelas empresas com o fim de respeitar os princípios do desenvolvimento sustentável. Lembrando, o desenvolvimento sustentável procura impactar positivamente a sociedade, respeitar o ambiente e ser economicamente viável; ou ainda, usar os recursos actuais de forma racional para que as gerações futuras também possam beneficiar-se dos mesmos. É oposto ao desenvolvimento tradicional, estritamente económico.

Muitas vezes, entretanto, se percebe a RSE como voluntária; um tanto quanto paradoxal: uma responsabilidade voluntária. De qualquer forma, a RSE indica-nos, nos lembremos, que a empresa deve fazer esforços para integrar a preocupação das populações circunvizinhas na sua agenda. Quanto maior a empresa, maior o raio de acção e maior o impacto de sua acção.

Nessora, a empresa tem mais um desafio na era das mudanças climáticas: não apenas integrar as outras preocupações da sociedade, mas privilegiar as preocupações ambientais, de combate ao aquecimento global. De outro modo, esta é também uma preocupação central da empresa, visto que o aquecimento global é uma ameaça existencial à longo prazo, uma ameaça para todos. Pois, sem humanos não existe comunidade, sem humanos não existe empresa. Ademais, a empresa não é alheia à comunidade aonde se insere – ela é parte da comunidade. 

Ao fim deste curto texto, podemos perceber que a RSE é na verdade uma obrigação ética, moral ou deontológica. E muitas vezes é traduzida em obrigação jurídica para a empresa. Ademais, a RSE é de interesse da empresa que a implementa. Finalmente, nos tempos que correm, com as preocupações ambientais no centro do interesse social, percetível ou não, as empresas podem procurar privilegiar este aspecto na sua agenda de RSE, sem evidentemente negligenciar elementos mais prementes. A decisão é sempre, na verdade, contextual. Mas para empresas quais suas acções tem um forte impacto ambiental (ecological footprint), é prudente privilegiar esse elemento.

 

Bibliografia

1.      Matthew Taylor, M. W. (2018, 10 8). The Guardian - IPCC Climate change report calls for urgent action to phase out fossil fuels - as it happened. Consultado a 12 10, 2020, em theguardian.com: www.theguardian.com

2.       Mukherjee, S. (2020, 12 10). Ecoomic Discussion. Consultado  em Economicdiscussion.net: www.economicdiscussion.net>socialresponsibilityofbusiness

3.      Nacir, A. C. (Produtor), & Mudando, I. e. (Realizador). (2018). As quatro revoluçoes industriais e o meio ambiente [Filme]. Informando e Mudando (Youtube).

4.      Youmatter. (2020, 11 6). Youmatter. Consultado em youmatter.world: yourmatter.world>rse-definition

 

 

 

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