Pode a Síndrome de Estocolmo Explicar as Relações Internacionais Pós-Coloniais? De Uma Abordagem Quase Ucrónica.
Pode a Síndrome de
Estocolmo Explicar as Relações Internacionais Pós-Coloniais? De Uma Abordagem
Quase Ucrónica.
Existirá um Eros
subconsciente entre as antigas colónias e as antigas metrópoles? Antes, façamos
uma breve revisão das palavras-chaves para perceber o presente texto. Tais
palavras são: Síndrome de Estocolmo, Relações Internacionais (RI) e
pós-colonial.
Primeiro, Síndrome de
Estocolmo é uma resposta psicológica aonde um cativo começa a identificar-se
favoravelmente com seus captores, incluindo a agenda e demanda desses últimos
Seguidamente, RI é o
conjunto de acções e interacções entre diferentes Estados na prossecução dos
seus Interesses. Assim, as situações de guerra, cooperação política, trocas
comerciais, entre dois ou mais Estados, são exemplos de RI. Ademais, inclui-se
nas RI entidades não estatais: indivíduos, associações, Organizações
Internacionais (OI’s), Organizações Não Governamentais (ONG’s), grupos
terroristas, organizações criminosas, entre outras. Todas essas instituições
participam então das RI.
Por seu turno, o termo
pós-colonial, se refere aos aspectos relacionados ao período posterior a
colonização, posterior aos processos de descolonizações. Seja por sentimento –
sentir-se descolonizado – ou prática – ser/estar descolonizado. Isso é, por RI
pós-colonial nos referimos as interacções entre as entidades supramencionadas
que ocorrem depois do período de descolonização. Porque sempre houve
colonização, sempre houve descolonização.
A descolonização,
percebida no sentido lato da palavra é um fenómeno continuo na História das
Relações Internacionais (HRI). Houve colónias desde há algum tempo. E houve
descolonização também de forma continua. Podemos tomar o Haiti como o marco
moderno da descolonização. Haiti que alcançou sua independência em janeiro de
1804, depois de uma sangrenta luta contra a França Napoleónica. Mas o que nos
interessa analisar agora é a descolonização no período da ordem bipolar –
guerra fria. Pois esses novos países vão surgir dentro de uma ordem bipolar, o
que os obriga a se posicionar em relação para essa ordem. E dessas descolonizações
vão surgir guerras, alianças e conflitos que nos ajudam a perceber a actual
ordem internacional.
Existem várias formas de
analisar o processo de descolonização. Uns usam as vagas de descolonização,
quais podemos resumir à três. Primeira vaga, concentrada sobretudo na Ásia e
imediata ao fim da segunda guerra mundial; segunda vaga concentrada sobretudo
na África Ocidental e outros lugares, na década 1960; e finalmente a terceira
vaga, que se concentra depois de 1970.
Todavia, outros usam o parâmetro geográfico; concentrando-se assim nas
descolonizações ou (i) de acordo com o continente, ou (ii) de acordo com a
metrópole em causa. Nós tomaremos a década 70 como o marco para o início das RI
pós-coloniais.
A ideia ucrónica neste
texto se baseia no facto de que se faz alusões para argumentos lógicos qua por
vezes não foram seguidos. Então se pensa de forma logica, mas por meio de um
paralelismo entre a logica que ocorre e a logica que deveria ocorrer. Isso
porque ucronia é muitas vezes considerada como história apócrifa
A pergunta que pode
emergir no leitor é: como transferimos um conceito da psicologia, isso é de
nível individual, para analisar as relações entre Estados ou entre este e
outras entidades? É, efectivamente uma questão pertinente. Na verdade, essa
questão pode ser respondida pela ideia de que “as relações internacionais são
uma alegoria para as relações humanas”. Isso é, o que acontece ao nível estatal
é um reflexo do que acontece ao nível pessoal, individual. Há uma transposição
das relações interpessoais para relações inter-estatais. Aliás, os Estados são
dirigidos por Homens, Homens que apesar de serem racionais e primarem pela razão
sobre a emoção quando dirigem os destinos dos Estados, não estão isentos e nem
imunes as emoções, aos sentimentos, ao páthos.
Nessora, podemos avançar
com a ideia central deste trabalho. Uma ideia provocativa. Observando a
história recente, é percetível enquadrar a síndrome de Estocolmo na relação
entre antigas colónias e antigas metrópoles. Isso porque, quando as metrópoles
colonizavam as colónias, o objectivo primário era a exploração das últimas.
Exploração de diferentes formas: populacional/demográfica (por meio da
escravatura), de recursos (uso dos minerais), dentre outras (presença da
população colonial). Desse modo, as metrópoles prejudicaram as colónias, regra
geral – mesmo que tenham deixado algumas heranças positivas. E em benefício das
antigas metrópoles, podemos acrescentar a ideia de heranças positivas
(infraestruturas) o argumento religioso segundo qual, se fazia a colonização
para transformar os povos bárbaros (das colónias) em civilizados. De qualquer
forma, os resultados foram negativos para as antigas colónias.
Foram resultados
negativos pois, houve pilhagem de recursos. Mas houve também pilhagem
intelectual, tendo se marginalizado tudo o que dizia respeito a identidade
cultural e intelectual dos povos colonizados. E talvez essa pilhagem seja a
mais importante, porquanto encontramos ainda hoje vestígios de complexo de
inferioridade (a ideia de que os povos colonizados são inferiores
comparativamente aos povos colonizadores) por exemplo, nalguns nacionais das
antigas colónias. Aliás, o facto de estarmos aqui a relacionar a síndrome de
Estocolmo para as RI pós-coloniais nos remete a probabilidade, ao menos, dos
danos ocorridos nas antigas colónias.
Assim, se seguirmos um
argumento lógico e, eventualmente, ucrónico, as colónias que conquistaram a
independência deveriam distanciar-se das antigas metrópoles. Distanciar-se não
significa extinguir as relações, mas limitar as relações, não aprofundar as
relações, não oferecer benefícios múltiplos as antigas metrópoles. Este ponto é
evidentemente limitado pela ideia de racionalidade da acção do Estado – o
Estado não tem sentimentos. Até que ponto, entretanto? Bem, a ideia de limitar
as relações se mostra lógica pelo facto de as antigas metrópoles terem
prejudicado as antigas colónias.
E se as RI são uma
alegoria para as relações pessoas, que diríamos de um Homem que mantém relações
profundas de amizade com outro Homem que o prejudicou? Religiosamente, talvez
mencionaríamos sua nobreza de alma. Mas racionalmente? Não seria justo
considerar que o mesmo não aprendeu com a história? Ou talvez apenas mantém
tais relações porque as circunstâncias obrigam. Ou talvez mantem tais relações
porque sente afecto pelo Homem que o prejudicou (síndrome de Estocolmo). E a
lógica desse argumento é ainda mais intensa se considerarmos as colónias que
conquistaram a independência por via armada. Quanto sangue? Quanto luto? Mas o
Estado não tem sentimentos!
Todavia, o que temos
verificado é uma forte cooperação entre antigas colónias e antigas metrópoles.
É igualmente lógico nessora diagnosticar as antigas colónias com síndrome de
Estocolmo, pelo sentimento de proximidade, eventualmente de amor para com as
antigas metrópoles; essas que as prejudicaram. Não terá o Estado sentimentos?
Isso porque, nas Relações Internacionais Contemporâneas (RIC), as antigas
metrópoles continuam a beneficiar dos recursos existentes nas antigas colónias,
por vezes de forma relativamente exponencial face ao passado colonial. Alguns
falam de neocolonialismo. Outros falam de nova forma de escravatura.
Eventualmente caminhemos para tais situações. Eventualmente alguns paises
estejam em tais situações.
Todavia, este artigo
procura apenas criar uma reflexão sobre as relações entre as antigas metrópoles
(hoje, muitas das quais consideradas países do Norte) e as antigas colónias
(hoje, muitas das quais consideradas países do Sul). Essa reflexão pode nos permitir
caminhar para uma situação mais justa e sobretudo benéfica para as antigas
colónias (hoje países em desenvolvimento, na maioria dos casos) que muito
ajudaram no desenvolvimento das antigas metrópoles (hoje países desenvolvidos,
na maioria dos casos).
Uma nota de fim. A
ciência se tem vangloriado de basear-se em factos, dados, evidencias para
produzir suas analises. E este artigo talvez não tenha tais características.
Mas é o objectivo mesmo deste artigo de se limitar a uma abordagem
resumidamente conceptual, não trazendo por exemplo nomes de países, não
indicando os números relativos as relações entre as diferentes entidades, não
expondo os lideres de países em desenvolvimento que demonstram preferências nos
serviços (de saúde, bancários) oferecidos pelos países desenvolvidos, não
informando sobre a propriedade financeira e de capital dos países desenvolvidos
nos países em desenvolvimento. Em resumo, não evidenciando as nuances que
demonstram a síndrome de Estocolmo. De forma analítica, é o que pode se
observar. Mas, dificilmente saberíamos se é uma observação que resulta de
comportamento voluntario ou não; mas e a síndrome de Estocolmo? Terá o Estado
sentimentos?
In fine, talvez a intensa
cooperação entre países desenvolvidos e países em desenvolvidos pode ser
percebida por meio da síndrome de Estocolmo. Eventualmente, os países do Sul
têm um forte Eros para com os países do Norte. Provavelmente, as antigas
colónias ainda não cortaram o cordão umbilical que lhas liga às antigas
metrópoles. Porventura, não estarão os países do norte satisfeitos com o actual
status quo (passe a tautologia)?
Bibliografia
1.
Dicionario Online de Portugues. (20 de outubro de 2020).
Dicio. Obtido de Dicionario Online de Portugues : www.dicio.com.br
2. Lambert, L. (20 de setembro de
2020). Britannica. Obtido de britannica.com:
www.britannica.com>science>Stockholm syndrome
Comentários
Enviar um comentário