DO ADVENTO DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL AOS DESAFIOS DE UMA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL NO MERCADO LABORAL


Artigo escrito por: Amade Casimiro Nacir  

O advento da Inteligência Artificial (I.A.) produziu em paralelo a suposição, muitas vezes correcta, de que algumas formas de trabalho humano perderão importância, serão substituídas pela I.A. Mas, a situação não é tão catastrófica assim. Aliás, surge daí a importância da Inteligência Emocional (I.E.). Note-se que, não obstante se estar a pesquisar diferentes tipos de inteligência desde os séculos passados, o desenvolvimento prático da I.E., como uma forma de inteligência separada da inteligência cognitiva, é recente.  

Por um lado, Perreira (1988 :1) considera que a I.A.  “(…) é uma disciplina científica que utiliza as capacidades de processamento de símbolos da computação com o fim de encontrar métodos genéricos para automatizar actividades perceptivas, cognitivas e manipulativas, por via do computador.” Neste texto, usaremos inadvertidamente I.A., automatização e robot para o mesmo significado. 

Por outro lado, a I.E., é definida como a “habilidade de estar consciente de suas emoções e das emoções dos outros, e o uso desse conhecimento para ajudar a gerir e expressar emoções e comportamentos que criarão sucesso e não obstáculos. (McPheat, 2010: 9). Extensivamente podemos adicionar a inteligência cultural e a inteligência social à I.E. 

Resultante do rápido desenvolvimento da I.A., surgiu a ideia de que a força laboral humana vai perder importância em detrimento da automatização, o que significará a idade da I.A. (Kurzweil, 2001-2003). De facto, existem actividades que tradicionalmente eram efectuadas por Homens e actualmente são sequestradas, talvez definitivamente, pela I.A. Por exemplo, nos bancos, a necessidade da força laboral humana tem reduzido gradualmente visto que máquinas podem agora nos auxiliar a efectuar determinadas transações. Alguns restaurantes e supermercados têm sistemas automatizados de pedidos e pagamentos através de máquinas, relegando a força laboral humana para uma posição de supervisão, ou lha eliminando. Ainda, um tanto quanto inusitado, no âmbito jurídico, há máquinas que, algoritmicamente, separam processos em função de determinado critério. 

Se quisermos continuar podemos ainda mencionar estações de serviço (onde o cliente abastece sozinho o seu automóvel), processo de check-in para viagens aéreas (qual já é possível fazer virtualmente), trabalhos indústrias (máquinas que efectuam todo processo de fabrico) ou a profissão de motorista (carros ou comboios automáticos). Ademais, existem benefícios imensuráveis da aplicação da I.A. na física, biologia, química, ergo medicina. Podemos mencionar as máquinas de ressonância magnética, máquinas de raio x, máquinas de análise sanguínea avançada, etecetera. 

Independentemente do avanço da I.A. e dos inúmeros benefícios que dela resultam, a I.A. não pode ainda efectuar todas as actividades desempenhadas pelos Homens (Rosembaum, 2017). Aqui entra a importância da I.E., pois trabalhos que exijam criatividade, senso comum ou cultura geral, são certamente para Homens. Adicionalmente, robots são fabricados para um fim – diagnóstico de doenças, contagem de dinheiro, identificação de parâmetros, etecetera – o que não acontece com o Homem, pois este adapta-se e muda de objectivos ao longo do tempo. A I.E., é uma habilidade exclusiva aos humanos. Certamente que não podemos competir com a automatização no que concerne a actividades mecânicas – contagem de dinheiro, por exemplo. Mas podemos competir com a automatização no que concerne a actividades criativas – elaboração de projectos sociais, por exemplo. 

Uma ideia se mostra interessante nessa discussão: circunstâncias. Circunstâncias mudam, constantemente, logo, precisam de alguém que lhas possa ler e adequar-se a elas, o que a robótica ainda não consegue fazer, se comparada aos Homens. Esquematicamente, existindo a necessidade de realizar uma actividade que consista na deslocação do ponto A para Y, pode-se assumir, razoavelmente, que a I.A. pode lhe efectuar eficazmente; mas, se durante o percurso surgir um obstáculo não pensado que necessite a suspensão da actividade? a I.A. é programada, assim não responde com sucesso a situações não programadas. Inversamente, a I.E. permite a analise de situações não programadas.

Se as circunstâncias começam a expor os limites da I.A. e evidenciar as vantagens da I.E., podemos ainda mobilizar outro conceito. Desta feita percebamos dinâmica. As sociedades seguem uma certa dinâmica e é tal dinâmica que lidera a sociedade até que esta última decida mudar a primeira.  Da mesma forma, existem determinados tipos de trabalho que sustentam a sociedade, mas não o inverso. Essas premissas fornecem a ideia de que os trabalhos são importantes durante um certo período, são úteis dentro da dinâmica que a sociedade segue, principalmente os providenciados pela automatização. Outrora consideradas inovações tecnológicas de última geração, o que dizer actualmente do comboio à vapor, do telefone fixo?

A vida, os problemas e soluções que conhecemos hoje não serão a/os/as que teremos no futuro. Mesmo que possamos prever, não se pode ter certeza de como a vida será no futuro. A dinâmica é imprevisível, mas humanos sabem adaptar-se. Entretanto de que forma um robot construído hoje, para resolver os problemas actuais saberá como resolver os problemas de amanhã? Poderá um aparelho de diagnóstico de cancer do pulmão ser capaz de diagnosticar um novo tipo de cancer que eventualmente surgirá? Uma máquina de identificação de padrões de crimes de lavagem de dinheiro poderá identificar padrões de um crime que surgirá na posterioridade?


A ideia de dinâmica nos permite transcender o debate binário I.A. ou I.E. Deve surgir a questão: de que forma a I.E. pode estar ao serviço da força laboral humana? A I.E. pode nos auxiliar a potencializar actividades que envolvam criatividade, senso comum, intuição, senciente, pensamento além dos padrões sociais (o que alguns chamam de ‘pensar fora da caixa’), etecetera. A criatividade é uma das características peculiares dos seres humanos e poucos robots conseguem igualar-nos neste quesito. O senso comum é um factor importante quando se compete com a automatização. Nós somos fortemente condicionados pelo ambiente aonde evoluímos, e dentro deste sabemos o que é bom ou mau. E ambientes mudam, como também a noção moral de bem e mal. Tais mudanças estão além da característica programática da automatização. 

A I.E. pode permitir aos Homens de melhor identificar as actividades que eles têm vantagens comparativamente à automatização. Evidentemente, as habilidades acima evidenciadas não são universais, nem ao alcance de todos humanos e nem aplicáveis para todos campos laborais. Há posições em que a automatização oferece vantagens se comparada com o trabalho humano. Assim, o que deve ser desenvolvido, inicialmente, nos seres humanos, é sua capacidade de identificar as áreas aonde sua performance é melhor que a dos robots. Seguidamente potencializar tais áreas. 
McPeath (2010: 16), comparando trabalhadores com uma I.E. elevada aos com deficiência desta inteligência, percebe que os últimos são facilmente travados por obstáculos enquanto os primeiros facilmente contornam obstáculos. Essa facilidade de contornar obstáculos deriva da disposição em parar e analisar as circunstâncias presentes, o que se consegue através de uma prática constante da I.E. Extensivamente, a automatização não permite essa paragem e analise regular das circunstâncias, aliás, seria contraditório a ideia de automatização. Pessoas equipadas com a I.E. compreendem melhor seu ambiente, ergo respondem melhor aos desafios. 

Adicionalmente, o local de trabalho é, paradoxalmente, também lugar de discussão de assuntos extraprofissionais. Robson (2017) considera que a habilidade do ser humano em distinguir seus colegas e de assim saber como trabalhar com cada um deles é o que determina o sucesso profissional.
Quando se interage com uma máquina, um rebote, sabemos que sua linguagem é programada e mesmo que possamos conversar com este, a conversa resta sem significado. Mas uma conversa com um ser humano é diferente: existe a intonação, os gestos, o senso comum, a expressão facial, etecetera. Para bem ou para mal, o ser humano é um ser social; a sociedade é o seu habitat. O que esperar de um ser humano rodeado por máquinas?

Contudo, como exposto acima, a questão não deve ser entre um ou outro, entre I.A. e I.E., automatização e humanização, entre robots e pessoas, mas, como utilizar a automatização com a finalidade de obter ganhos humanos. Assim existe a necessidade de romper com esse falso dilema que força à um resultado apocalíptico: ou IE ou IA. É ingenuidade recusar as vantagens da I.A. É também ingenuidade recusar as vantagens da I.E. Mas é ainda ingenuidade recusar a existência dos perigos ligados au uso massivo da I.A. Dessa forma, à princípio paradoxal, uma relação simbiótica deve ser preferida. Paradoxal porque, a I.E., deve primar sobre a I.A. Isso é, na escolha dos mecanismos de aplicação da I.A. deve-se considerar, a I.E., podendo, depois, aplicar as duas de forma paralela. Nessa saga, é importante assegurar uma legislação consciente da I.A., uma legislação que limita o uso da IA em benefício do homem.

Referências 
1. A. NUSCA (FORTUNE), (2017), Humans vs. Robots: How to Thrive in an Automated Workplace - http://fortune.com/2017/06/30/humans-robots-job-automation-workplace/, consulted in December 07th 2017, 18h56min. 
2. D. ROBSON (BBC) (2017), In Our Era of Globalization, Your job Performance may Depend on Your “CQ”. So What is it?, article published in October 13th 2017 and consulted in December 30th, 2017. 
3. L. M. PERREIRA (1988), Inteligência Artificial – Mito e Ciência, "Colóquio/Ciências - Revista de Cultura Científica", nº 3, pp 1-13, Outubro 1988, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. 
4. QUARTZ MEDIA - https://qz.com/517506/the-three-things-humans-will-always-do-better-than-robots/; consulted in December 07th 2017, 18h:00min. 
5. R. KURZWEIL, (2001-2003), The Ray Kurzweil Reader, a collection of Essays by Ray Kurzweil Published on KurzweilAI.net 
6. S. MCPEATH (2010), Emotional Intelligence, MTD Training. 
7. S. ROSEMBAUM (FORBES), (2017) - https://www.forbes.com/sites/stevenrosenbaum/2012/11/26/humans-vs-robots-whos-on-top/#24e52c6e67bd; consulted in December 07th 2017. 

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